domingo, 27 de fevereiro de 2011

O valor actual do conhecimento científico

Ao longo da história, o pensamento racional e científico tem vindo a colocar em posição dominante os critérios da objectividade, do real e do verdadeiro, em detrimento dos critérios que nascem do senso comum e da sensação ou da intuição.
Sherry Turkle, no seu livro "O Segundo Eu" de 1984, já tinha alertado para o seguinte: enquanto o ser humano tinha os animais como entidades mais próximas, ele identificar-se-ia por oposição como ser racional. Agora que as entidades mais próximas são os computadores e máquinas, ela previa que os seres humanos iriam identificar-se, mais uma vez por oposição, como seres emocionais e intuitivos.
A verdade é que as pessoas têm vindo a valorizar a emoção e a intuição como formas de aceder ao conhecimento. Muitos consideram mesmo que a razão e a ciência são empecilhos ao conhecimento autêntico. E, cada vez mais, tanto pessoas incultas como cultas aderem a estes pontos de vista.
Este estado de coisas é tanto mais paradoxal quanto o nível de instrução das pessoas tem vindo a subir de forma significativa. Porque acontece isto?
Uma explicação possível reside no facto de a educação facultada às pessoas ter-se vindo a tornar progressivamente mais laxista. As pessoas saem, assim, do sistema de ensino sem um conhecimento solidamente constituído.
Antigamente, havia muita gente analfabeta, mas era gente que respeitava o saber. O que há de diferente hoje é que os jovens não respeitam o saber. Chegam mesmo a reduzir o conhecimento científico a uma mera opinião, a algo de facilmente descartável face a outra qualquer representação do mundo que os atraia mais e que "intuitivamente" lhes pareça ser mais verdadeira.

Não tenho uma visão antropocêntrica do conhecimento, admito mesmo que provavelmente não existe uma forma única de fazer ciência. Também desconfio de muito conhecimento que se arroga de científico e que, depois, dá provas do mais absoluto desastre (como a Macroeconomia).
Mas preocupa-me que todos os tipos de conhecimento sejam igualmente valorizados. Chega mesmo a assustar-me que as pessoas achem que todas as proposições, por mais absurdas e estapafúrdias que sejam, podem assumir o estatuto de conhecimento. Porque, ao contrário do que se quer fazer crer, não são portas que se abrem para o desenvolvimento da humanidade (são-no apenas para os oportunistas).

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Eficácia da punição e outros valores

B. F. Skinner dizia que punir comportamentos desadequados é uma má estratégia para os alterar porque:
  1. Limita o seu objectivo à supressão do comportamento e não à aprendizagem de um novo mais desejável.
  2. Suprime-os no curto prazo, mas é duvidosa a sua eficácia a médio e longo prazo.
  3. Provoca o emergir de emoções e de sentimentos de rancor, vergonha e agressividade no aprendente.
  4. Promove comportamentos de evitamento e de fuga, pouco úteis em situações de aprendizagem.
  5. Vai desenvolvendo hábitos nos punidores.

Refira-se que tudo isto tem tido o apoio empírico da investigação, tanto em seres humanos como em animais.
Claro que Skinner refere isto no âmbito de uma teoria da aprendizagem apenas. No fundo, ele diz que, se o nosso objectivo é que ocorra a aprendizagem de um comportamento correcto, então uma forma mais eficaz de o conseguir é reforçá-lo positivamente quando ele ocorre, ou quando o aprendente revela mudanças no sentido de se aproximar dos comportamentos correctos. Deste modo, o aprendente tem indicações úteis e fiáveis que o orientam com segurança para a aprendizagem adequada.

Só que o que muitas vezes está em jogo não é só a aprendizagem.
Logo à partida, muitas vezes pretende-se apenas isso mesmo, suprimir um comportamento (por exemplo, conseguir que os condutores não excedam os limites de velocidade).
Mas há também que garantir um sentido moral para a existência. Isto é, garantir que um mau comportamento é devidamente reconhecido (tal como o bom comportamento), proporcionando-lhe uma consequência correspondente. E, no fundo, dar a perceber que as pessoas não podem fazer o que querem, que o viver em sociedade implica regras e que, se elas não forem razoavelmente cumpridas, isso trará efeitos nefastos para quem as quebra. No mínimo, porque há que proteger os mais fracos.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Escrever artigos

Um dos problemas com que os alunos se defrontam ao chegar à universidade consiste em saber como escrever artigos com carácter científico e como apresentá-los. Aqui vão algumas sugestões de leituras minhas e que considero úteis (não irei incluir as que de pouco me serviram):

Basics of APA Style Tutorial, acedido em 19 de Fevereiro de 2011, em http://flash1r.apa.org/apastyle/basics/index.htm

Caldeira, P.Z. (2008). Regras e Concepção para a Escrita Científica (área da psicologia). Lisboa: Climepsi. [existente na Biblioteca da UAlg - 001.89]

Weston, A. (2005). A Arte de Argumentar. Lisboa: Gradiva.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Sistemas sensoriais, recompensas e motivação

Uma das características dos sistemas sensoriais é que se habituam. Quando a estimulação se prolonga no tempo, os receptores sensoriais param de reagir a essa estimulação. Para voltarem a reagir é necessário que haja ou uma interrupção ou uma intensificação da estimulação.
Curiosamente, existe  uma correspondência com a motivação. Tem-se demonstrado que a recompensa "cansa",  a menos que seja retirada o mais cedo possível (depois de ter sido usada apenas em casos de grande desmotivação) (Jesus, 2008) ou que, em alternativa, seja indefinidamente aumentada. Em qualquer dos casos sabe-se que a recompensa externa destrói a motivação interior (Ryan & Deci, 2000), pelo que a sua utilização deve ser sempre evitada.

Referências:
Jesus, S. N. (2008). Estratégias para motivar os alunos. Educação, 31(1), 21-29. Acedido em http://redalyc.uaemex.mx/redalyc/pdf/848/84806404.pdf
Ryan, R. M., & Deci, E. L. (2000). Self-determination theory and the facilitation of intrinsic motivation, social development, and well-being. American Psychologist, 55, 68-78.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Estratégias para motivar os alunos, de Saul Neves de Jesus

Estratégias para motivar os alunos

Porque razão este artigo é uma excelente leitura para qualquer educador, mas principalmente para professores?

  1. A produção científica deste autor revela que ele, à partida, ouviu realmente os professores (Jesus, 2000) e que conhece bem a escola, os alunos e, claro, os professores. Daí que não haja nunca irrealismo nas propostas que ele faz.
  2. O autor tem um profundo conhecimento das teorias mais modernas da motivação (Jesus, 2000).
  3. Este artigo engloba duas situações que o autor considera estarem sempre interrelacionadas: a de falta de motivação e a de indisciplina.
  4. É aqui feita uma proposta exaustiva de uma grande diversidade de estratégias, quer para controlar o surgimento dessas situações, quer para promover a sua resolução e a sua superação. Estas estratégias encontram-se diferenciadas em dois grupos, um para cada uma daquelas situações e incorporam as descobertas mais recentes no domínio das teorias da motivação.
  5. A apresentação destas estratégias não é feita de modo avulso, mas é devidamente enquadrada e contextualizada. E não se deixa limitar pelo enquadramento teórico em que o autor se move e que define logo no início.
  6. O autor sabe, e leva em conta, que se dirige a professores extremamente cansados e, em muitos casos, bastante desanimados.
Em suma, os professores têm assim aqui a possibilidade de escolher as estratégias mais adaptadas quer à sua maneira de ser, quer aos problemas com que se defrontam, quer aos alunos que têm diante de si.

Referências:
Jesus, S. N. (2000). Motivação e Formação de Professores. Coimbra: Quarteto Editora.

domingo, 13 de fevereiro de 2011

Competição e motivação

Tive uma disciplina (Psicologia da Motivação e da Emoção I) em que levámos todo o semestre a aprender teorias da motivação.
No final, surpreendido pelo facto de nenhuma se referir à competição como forma de motivar as pessoas, interroguei a professora (da área da Psicologia Social e das Organizações).
Ela disse-me que, tirando o desporto profissional que é considerado um caso à parte, a competição implica normalmente um crescente desinteresse pela tarefa em questão (principalmente se a pessoa achar que tem poucas hipóteses de "vencer"). Mas, pior, implica muitas vezes a diminuição dos competidores (criada intencionalmente pelos que querem ganhar, ou é simplesmente fruto da "derrota").
Ora, os psicólogos teóricos desenvolvem teorias que conduzam ao desenvolvimento de todas as pessoas, nunca pretendendo que isso possa ser conseguido à custa de quem quer que seja. Por isso, a competição nem sequer é considerada ou discutida nas teorias da motivação.